“Gostaria que os outros pais sofressem menos e vivessem mais”, relata mãe

02/02/2018 2 Por Maria Amélia M. Franco
“Gostaria que os outros pais sofressem menos e vivessem mais”, relata mãe

A hashtag #naoeofim talvez resuma muito do que falarei hoje por aqui com você. Vou contar a experiência dos gaúchos Liana e Daniel, que é parte da história do Érico, seu filho. Gosto de relatos como o deles, pois são inspiradores e cheios de aprendizados.

Quando o Érico nasceu, seus pais notaram que ele era estrábico. Intuitivamente Liana sabia que havia algo errado enquanto o amamentava.

Então aqui vai o primeiro aprendizado: sim, é natural observar desvios esporádicos nos olhos dos recém-nascidos até os 4 meses de idade. Contudo, não é normal desvios oculares frequentes ou permanentes nessa fase, ou qualquer desvio após o 4º. mês.

Érico já tinha feito o teste do olhinho mas não acusou nada errado. Contudo, por intuição, aos 3 meses o levaram ao oftalmopediatra.

E é isso mesmo, mãe sabe e tem que seguir a intuição. Esse é o segundo aprendizado.

A confirmação de que algo não estava bem

Nem preciso falar que eles fizeram de tudo para marcar o quanto antes a consulta… Lá o diagnóstico não foi animador, e a forma como foi dito parecia ser um pesadelo. Resumindo, Érico teve persistência hiperplásica de vítreo primário (PHVP), que deveria ter sido tratada com cirurgia de urgência logo após o nascimento.

“Não vou dizer que as coisas que ouvi não aconteceram, mas foi muito duro escutar tudo de uma vez só. Eu precisava, primeiro, saber que tudo ficaria bem, mas que antes disso teríamos um longo caminho. Naquele dia, o futuro parecia sombrio, cheio de poréns. Saí da consulta horrorizada e culpada”, relata Liana.

Sim, não é fácil receber esse tipo de notícia, será que tem como estar preparado para isso?

O PHVP (atualmente também chamado vascularização fetal persistente – VFP) é uma das causas de catarata infantil, decorrente do desenvolvimento anormal do vítreo e da vascularização intraocular já nos primeiros meses da gestação. Ainda se desconhece por que essa malformação pode acontecer.

Na maioria dos casos se manifesta como um reflexo branco na pupila (leucocoria), em apenas um dos olhos, que é menor (microftalmia). Estão relacionadas diversas complicações como descolamento de retina, glaucoma e anormalidades no nervo óptico.

O tratamento em geral prevê cirurgias e estimulação para ajudar a desenvolver a visão desse olho, ainda que seja um resíduo visual. Portanto, requer cuidado e folow-up meticulosos do oftalmologista pediátrico e do cirurgião vítreo-retiniano.

Saiba a importância da consulta de bebês com o oftalmologista

Clique e confira matéria do G1-RBSTV sobre o caso do Érico e as dicas importantes dos pais e do oftalmologista para alertar a todos!

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A informação que empodera os pais

Difícil estar preparado na primeira consulta! Entretanto, para as próximas visitas sim. Aqui vai o terceiro aprendizado: vá para a consulta com possíveis dúvidas em mãos. Na hora você tem que ficar com um olho no médico e o outro no filho e depois vem aquele turbilhão de coisas… já viu! Veja algumas ideias:

  • O que os exames revelaram?
  • Pode repetir o diagnóstico e o nome certinho do problema para eu anotar?
  • Por que isso acontece, tem uma causa?
  • Qual o prognóstico? O que é normal, o que é esperado, quais são os cenários otimistas e pessimistas?
  • Como isso afeta a qualidade de vida do meu filho?
  • Ao que devo ficar atento? Como devemos proceder?
  • Poderia anotar nome e contato dos profissionais que está indicando? Poderia fazer uma carta/um encaminhamento do meu filho para tentarmos um atendimento rápido?
  • Que esclarecimentos e orientações devo fazer à babá, aos familiares ou na escola?
  • Você poderia deixar seu contato direto para alguma dúvida importante ou uma emergência? Na impossibilidade de contatá-la, a quem (qual lugar) devo recorrer?
  • Quando deve ser o nosso retorno?
 

Liana diz que “a informação empodera nós, pais, que estamos ali, no dia a dia, literalmente de olho nos nossos filhos”. Concordamos, não é mesmo? Por isso é tão duro fechar as portas do consultório e ir embora com tantas interrogações.

O resumo da ópera

Arquivo pessoal

Daniel resume o seu pensamento na época do diagnóstico e ele continua atual: “vamos fazer o que tivermos que fazer”.

Assim, desde os 3 meses até agora o Érico já passou por 5 cirurgias. Teve dois descolamentos de retina e uma complicação na córnea devido a intercorrências no tratamento. Enquanto havia expectativa de recuperar a sua visão, ainda que parcial, ele fez estimulação visual em casa. Os pais foram orientados por uma fisioterapeuta especializada. “Esse período foi bem difícil. Ele usava tampão no olho bom, mas logo ficava entediado e dormia. Andávamos com cronômetro no pescoço para cumprir as horas diárias de terapia e a minha casa parecia uma loja de R$ 1,99, tudo virava estímulo”, conta Liana. Houve ainda uma longa fase em que ele vivia com os olhos lacrimejando e tinha uma sensibilidade extrema à luz. “Era uma luta diária, contada hora a hora o colírio que usávamos, por mais de um ano”, completa.

Aos seis meses houve a perda de visão do olho direito e o problema na córnea causava inflamações e dores constantes. “Paramos a estimulação e começou a luta para preservar o olho em si, que havia entrado em processo de atrofia. A situação ficava cada vez mais delicada e a nossa qualidade de vida caia cada vez mais. Percorremos vários oftalmologistas (inclusive em São Paulo) e encontramos uma alternativa à retirada do olho, que foi de cara proposta por um dos médicos para ‘resolver logo a situação’. A solução seria recobrir a córnea afetada e preservar o olho para não prejudicar o crescimento da face. Enfim, uma notícia boa em 1 ano e meio de luta! Futuramente, havia ainda a possibilidade de colocar uma prótese ocular chamada tecnicamente de lente escleral.”, explica a mãe.

Após o procedimento, aos poucos eles conseguiram retirar os colírios de corticoides e manter só os lubrificantes. Já aos dois anos e meio tentaram colocar a lente escleral, que ficaria por cima do olho, oferecendo proteção total contra a luz. Contudo, o Érico não se adaptou e seus pais preferem esperar por uma futura tentativa, ou uma nova alternativa, confiantes nos avanços da medicina. Hoje ele tem três anos e sete meses e possui visão monocular.

criança com catarata infantil
Arquivo pessoal

Não é o fim

O tratamento exige muita disciplina e cuidado. A vida segue, tem que seguir, mas em geral ela não é uma vida “normal”. “Com tantas cirurgias, além de exames e do desconforto visual causado pela luz, deixamos de curtir muitas coisas de crianças juntos, como ir a praças e parques. Logo, com 11 meses, ele entrou na escola e tudo passou sem sentirmos que vivemos”, lamentam os pais.

Por fim, eles aprenderam a ressignificar a vida como um todo. Por isso, eles compartilham o quarto aprendizado: “gostaríamos que os outros pais sofressem menos e vivessem mais.A rotina exaustiva de hospital e consultas acaba roubando uma fase linda da vida dos nossos filhos. Queríamos que os outros não se deixassem levar pela dor. Existem perspectivas boas, sim. O nosso filho é feliz. Gostaríamos tanto de ter sabido que isso seria possível. As crianças se adaptam e nós também”.

Liana destaca ainda como os pais precisam ser amparados nesse momento. “A dor da descoberta é legítima, porém é preciso ajudá-los a ver as coisas com uma perspectiva mais otimista e oferecer apoio para que não se sintam solitários. Isso não quer dizer ouvir um ‘tudo vai dar certo’ porque muitas vezes é desagradável falar sobre isso, como se fosse um tabu. Pelo contrário, é importante falarmos de tudo, a respeito do luto de descobrir que o filho não é ‘perfeito’ (entre muitas aspas) e acolher o choro, os lamentos e o turbilhão de sentimentos.”

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